Continuação do Público de 2 de Outubro: "Na primeira página de Aldo há uma menina, ar triste, cabelo escorrido, uma saia às pregas, uma camisola amarela. E uma única frase: "Passo muito tempo sozinha". Os colegas da escola tratam-na mal, os pais discutem e esquecem-se dela. Mas a menina tem um amigo, um coelho de orelhas espetadas, e ar igualmente melancólico, chamado Aldo. É o seu amigo imaginário que a protege do mundo.
Foi John Burningham, um dos mais conhecidos ilustradores britânicos, autor de muitas dezenas de livros infantis, quem inventou a menina triste e o seu amigo imaginário. Burningham - que é casado com uma ilustradora e pai de três filhos - tem 70 anos, olhos azuis a aparecer por baixo de um sobrolho carregado, rosto sério, em alguns momentos quase angustiado. Assim, de pé ao lado dos seus desenhos, tem, por vezes, um ar tão desprotegido como a menina que inventou um coelho para ter um amigo.
Há 40 anos que Burningham desenha. E o traço mantém a simplicidade dos primeiros tempos - se calhar é esse o segredo de uma figura como o Aldo (de 1991), intemporal e capaz de fascinar crianças em todo o mundo. Mas 40 anos de trabalho não dão ao desenhador maior confiança. De cada vez que recomeça tem dúvidas, angustia-se. "Penso se conseguirei fazê-lo outra vez."
"Ter muita experiência torna as coisas piores", diz, na sua voz grave. "Penso "fiz todas estas coisas e agora não consigo... nunca mais vou conseguir usar a cor outra vez, ou fazer um desenho outra vez". E fico exausto quanto tento desenhar e as coisas não saem."
Burningham não faz, decididamente, as coisas parecerem simples, mas é desarmante a falar das suas limitações. "O que é terrível para um artista que usa a cor e o desenho é que pode de repente perceber que o desenho é terrível, as cores são horríveis. E não existe uma fórmula. Não posso dizer "sei o que estou a fazer mal". Alguma coisa está errada e não sei como fazê-la certa."
Por trás de cada desenho estão horas de tentativas, imensos planos da estrutura de cada livro. "Uma boa história é o que importa." E uma boa história pode ser tão simples como a do bebé que não comia, para desespero dos pais, e que um dia começou a comer abacates e se tornou tão forte que já segurava móveis no ar (Avocado Baby, 1982); ou, como em Granpa (1984), a da relação entre uma menina e o avô, que termina com a imagem do cadeira vazia do avô.
"Nunca penso nas crianças", confessa. "Sei que as minhas histórias são lidas em todo o mundo, por pessoas muito diferentes, por isso devo ter uma fórmula que funciona. Mas não sei qual é. Quando os pais me dizem "o meu filho adora as suas histórias, tenho que as ler todas as noites", fico muito contente, mas não quero saber muito mais sobre isso."
Na sala do CCB onde os seus desenhos podem ser vistos (ver caixa) está um grupo de crianças sentadas no chão em frente deles. Uma das animadoras pergunta-lhes o que é que o Aldo gostará de fazer. "É do Sporting", diz um, por causa do cachecol verde e branco. "Gosta de andar de patins", lança outro. "E de contar histórias", acrescenta um terceiro.
John Burningham não precisa de entender o que é que Aldo tem para as crianças gostarem dele. Basta-lhe que gostem.
Desenhadores britânicos para conhecer até dia 31
Os desenhos de John Burningham - e os de 12 outros desenhadores britânicos, num total de 70 ilustrações - podem ser vistos na exposição Magic Pencil - Lápis Mágico, organizada pelo British Council e pelo Centro de Pedagogia e Animação do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, até dia 31. Para além das ilustrações nas paredes, em mesas baixas as crianças poderão ver e manusear outros livros, e ao fim-de-semana participar nas visitas guiadas, em português e inglês, feitas por rapazes e raparigas entre os 13 e os 18 anos. Há ainda oficinas para crianças (entre os 4 e os 12 anos) em torno dos livros, dos desenhos, da música e da língua inglesa. A English Language Workshop contará, nos dias 23, 24 e 25 com a contadora de histórias britânica Elly Stuart. A ideia por detrás da exposição? "Imaginem um Lápis Mágico. Nesse lápis imaginem uma linha mágica à espera de sair. Ponham o lápis no papel. O que acontece?".".
Foi John Burningham, um dos mais conhecidos ilustradores britânicos, autor de muitas dezenas de livros infantis, quem inventou a menina triste e o seu amigo imaginário. Burningham - que é casado com uma ilustradora e pai de três filhos - tem 70 anos, olhos azuis a aparecer por baixo de um sobrolho carregado, rosto sério, em alguns momentos quase angustiado. Assim, de pé ao lado dos seus desenhos, tem, por vezes, um ar tão desprotegido como a menina que inventou um coelho para ter um amigo.
Há 40 anos que Burningham desenha. E o traço mantém a simplicidade dos primeiros tempos - se calhar é esse o segredo de uma figura como o Aldo (de 1991), intemporal e capaz de fascinar crianças em todo o mundo. Mas 40 anos de trabalho não dão ao desenhador maior confiança. De cada vez que recomeça tem dúvidas, angustia-se. "Penso se conseguirei fazê-lo outra vez."
"Ter muita experiência torna as coisas piores", diz, na sua voz grave. "Penso "fiz todas estas coisas e agora não consigo... nunca mais vou conseguir usar a cor outra vez, ou fazer um desenho outra vez". E fico exausto quanto tento desenhar e as coisas não saem."
Burningham não faz, decididamente, as coisas parecerem simples, mas é desarmante a falar das suas limitações. "O que é terrível para um artista que usa a cor e o desenho é que pode de repente perceber que o desenho é terrível, as cores são horríveis. E não existe uma fórmula. Não posso dizer "sei o que estou a fazer mal". Alguma coisa está errada e não sei como fazê-la certa."
Por trás de cada desenho estão horas de tentativas, imensos planos da estrutura de cada livro. "Uma boa história é o que importa." E uma boa história pode ser tão simples como a do bebé que não comia, para desespero dos pais, e que um dia começou a comer abacates e se tornou tão forte que já segurava móveis no ar (Avocado Baby, 1982); ou, como em Granpa (1984), a da relação entre uma menina e o avô, que termina com a imagem do cadeira vazia do avô.
"Nunca penso nas crianças", confessa. "Sei que as minhas histórias são lidas em todo o mundo, por pessoas muito diferentes, por isso devo ter uma fórmula que funciona. Mas não sei qual é. Quando os pais me dizem "o meu filho adora as suas histórias, tenho que as ler todas as noites", fico muito contente, mas não quero saber muito mais sobre isso."
Na sala do CCB onde os seus desenhos podem ser vistos (ver caixa) está um grupo de crianças sentadas no chão em frente deles. Uma das animadoras pergunta-lhes o que é que o Aldo gostará de fazer. "É do Sporting", diz um, por causa do cachecol verde e branco. "Gosta de andar de patins", lança outro. "E de contar histórias", acrescenta um terceiro.
John Burningham não precisa de entender o que é que Aldo tem para as crianças gostarem dele. Basta-lhe que gostem.
Desenhadores britânicos para conhecer até dia 31
Os desenhos de John Burningham - e os de 12 outros desenhadores britânicos, num total de 70 ilustrações - podem ser vistos na exposição Magic Pencil - Lápis Mágico, organizada pelo British Council e pelo Centro de Pedagogia e Animação do Centro Cultural de Belém, em Lisboa, até dia 31. Para além das ilustrações nas paredes, em mesas baixas as crianças poderão ver e manusear outros livros, e ao fim-de-semana participar nas visitas guiadas, em português e inglês, feitas por rapazes e raparigas entre os 13 e os 18 anos. Há ainda oficinas para crianças (entre os 4 e os 12 anos) em torno dos livros, dos desenhos, da música e da língua inglesa. A English Language Workshop contará, nos dias 23, 24 e 25 com a contadora de histórias britânica Elly Stuart. A ideia por detrás da exposição? "Imaginem um Lápis Mágico. Nesse lápis imaginem uma linha mágica à espera de sair. Ponham o lápis no papel. O que acontece?".".
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